A região de Quínara é ‘bemba’ de violação dos direitos humanos, desde abuso a menores, acusações de feitiçaria, excisão feminina, assassinatos e casamentos forçados. O Sul da Guiné-Bissau tem apenas dois tribunais um em Buba, outro em Quebo, regional e sectorial respectivamente. A região Sul da Guiné-Bissau registou nos últimos tempos quatro assassinatos, nalguns casos os assassinos ainda não foram identificados até à data.
A província sul depara-se igualmente com a insuficiência do pessoal na corporação da Polícia da Ordem Pública (POP) em todos os sectores. Por exemplo, o sector de Empada tem apenas quatro agentes da POP para uma população de cerca de dezaseis mil habitantes.
Quínara, com uma área de 3.138 km² e uma densidade populacional de 14,27 habitantes por km² e uma população total calculada em 52.134 habitantes no censo populacional de 2004, conta apenas com dois tribunais, um regional com sede em Buba (sede regional) e outro sectorial sediada em Quebo.
Constituem as principais localidades da região as cidades de Buba, Empada, Fulacunda e Tite, este último palco do primeiro tiro disparado pelas armas dos combatentes da liberdade da pátria Arafam Djamba Mané. Abria-se, então, a longa caminhada da luta armada para a libertação nacional. Ambos os sectores beneficiam dos serviços judiciais dos dois tribunais que cobrem toda a vasta província Sul do país.
Um dos maiores problemas daquela região é a impunidade, ou seja, as pessoas cometem crimes e ficam sem serem traduzidos em justiça, levando a que, muitas vezes, os lesados realizem a justiça por conta própria.
Outra situação tem a ver com as intervenções dos queixosos. Quando o caso segue os seus tramites legais, pedem, por vezes, que os processos sejam arquivados, invocando ligações familiares com o criminoso. Esse fato foi confirmado pela activista dos direitos humanos na região, igualmente vice-presidente da Liga Guineense dos Direitos Humanos (LGDH) de Quínara, Cesário Quartel da Silva.
Várias agressões físicas devidas a acusações de feitiçaria aconteceram no setor de Tite, que é campeã na referida matéria, assim como casos de casamentos forçados.
PROFESSOR MORTO E SEU CORPO ABANDONADO NO MATO DE TITE
Há pouco tempo, um professor que lecionava numa tabanca do sector de Tite foi encontrado morto. O seu corpo foi descoberto alguns meses depois da sua morte, abandonado numa mata, já numa fase avançada de decomposição, supostamente assassinado por um grupo de jovens da mesma aldeia. O professor tinha se deslocado à cidade de Buba para levantar o seu salário, o que estaria na origem do ataque e consequentemente a sua morte.
Ainda em Tite, um homem foi obrigado a abandonar o seu lar, na sequência de uma acusação de feitiçaria por um grupo de jovens. Julgaram que o velho em causa queria matar um jovem que estava doente. Depois de terem ameaçado de morte o homem em causa, ele não hesitou e foi buscar a protecção na Esquadra da Polícia sectorial, algumas horas depois da sua entrada na polícia, os jovens foram cercar a corporação policial de Tite. O número dos invasores era superior ao do pessoal de segurança pública do setor.
Um activista de direitos humanos daquele sector, ao tomar conhecimento da situação, diligenciou uma ligação para a sede regional em Buba, solicitando o reforço da corporação policial e da força militar instalada na região. A resposta chegou a tempo de salvar a vida do homem acusado. Polícias e militares deslocaram-se à tabanca dos jovens e detiveram todos os habitantes, desde os rapazes, homens e mulheres para de seguida levá-los para Buba a fim de serem identificados os autores daquela ameaça.
De acordo com o ativista da LGDH, o que estava em causa era a intenção de apropriação dos bens da vítima, tendo em conta que o homem tinha certa quantidade de gado bovino.
O responsável da LGDH considera que os fatos apontam o sector de Tite como sendo a pior localidade para ser velho, em toda a Guiné-Bissau. Justificando que todos os idosos são considerados feiticeiros, assim como os que se dedicam muito ao trabalho.
Tite é conhecido naquela região como um lugar onde os pais dão suas filhas em casamento forçado, ou seja, pai e mãe fazem acordos com o marido sem o consentimento da menina.
JOVEM ASSASSINA A PRÓPRIA MÃE NO SETOR DE EMPADA
O sector de Empada não foge à tempestade de crimes. No ano passado, um jovem aparentando ter 35 anos de idade, matou a própria mãe, depois de tê-la acusado de feitiçaria. No seu entender, a mãe pretendia matar um dos seus irmãos mais novo, que estava doente nas vésperas de entrar para a cerimônia de circuncisão (Fanado). O caso aconteceu na tabanca de Languê.
O “justiceiro” de 35 anos acusou à mãe de feitiçaria, daí começou a desenhar a estratégia para eliminar a mulher que lhe colocou neste mundo. A pobre mãe deslocou-se a procura da água no poço que fica um pouco distante das casas. A saída da sua mãe foi uma oportunidade para o jovem disfarçar que ia trabalhar para à bolanha. Montou uma emboscada no caminho e quando a mãe vinha da fonte com um balde de água à cabeça, agrediu a pobre senhora até à morte.
Depois de ter cometido o crime, o “espertinho” foi à bolanha e aproveitou para besuntar de lama as suas pernas, pensando assim que poderia desviar a atenção das pessoas, sugerindo com o gesto que tinha ido trabalhar. Voltou à residência familiar. Na altura, ninguém desconfiou que ele tinha cometido tão vil e bárbaro acto. Foi o próprio quem se dirigiu ao local do crime, gritando de regresso a casa, “Encontrei a minha mãe! Ela está morta”, “Encontrei a minha mãe! Ela está morta”.
Entretanto, as técnicas do “espertinho” não duraram muito tempo, porque os agentes da polícia sectorial executaram o seu trabalho de investigação e apuram que o jovem, fingindo-se de inocente, era o autor do crime. Em seguida foi levado à esquadra da polícia, acabando por confessar o assassinato da própria mãe, com a justificação da alegada “tentativa da mãe matar o seu irmão” que se preparava para as cerimônias do fanado.
O ativista da LGDH no setor de Empada disse à nossa reportagem que os quatro agentes da POP são insuficientes para uma população de mais de 15 mil habitantes, revelando que os jovens substituíram os pais que já não tinham forças para executar trabalhos policiais, afiançando que nem por perto conseguem fazer a mínima cobertura das oitenta e seis (86) tabancas que compõem o sector.
Neste particular, Cesário Quartel da Silva lembrou-se de um assalto ocorrido recentemente no sector. Os larápios assaltaram o estabelecimento comercial dos mauritânianos, a antena da empresa de telecomunicações Orange. Não houve policiais para seguir os rastos daquele bando de ladrões, mas que, graças a colaboração da população local, acabando os assaltantes por ser capturados e entregues aos agentes da POP, que por sua vez os encaminhou o caso para Buba.
O professor Cesário lamentou a forma como o assunto foi tratado, porque um dos bandidos que participou na onda dos assaltos no sector voltou a estar em liberdade em menos de uma semana, passeando novamente pelas ruas, impune, criando dor e revolta nas pessoas vítimas dos roubos, enquanto outros continuaram nas celas de Buba.
“É pena ver alguns dos ladrões do mesmo grupo a andarem aqui na Praça de Empada. Este tipo impunidade é que cria revolta nas vitimas a ponto de pensarem em fazer a justiça com as próprias mãos. Na verdade, não sabemos em que condições umas são libertadas e outras continuam detidas em Buba”, frisou.
JOVEM DE 25 ANOS VIOLA A PRÓPRIA IRMÃ DE OITO ANOS DE IDADE
Um jovem de 25 anos de idade violou sexualmente a própria irmã, de apenas oito anos de idade, na secção de Daresalam. O caso ocorreu no mês de Novembro do ano findo.
O pedófilo aproveitou-se da ausência dos pais. O pai fora procurar um medicamento para a cura de uma doença, em Mansaba (uma aldeia da mesma secção) e a mãe acompanhou o marido. Como o rapaz de 25 anos era o filho mais velho, os pais pediram-lhe que passasse a dormir no mesmo quarto com a criança aproveitando a ausência dos velhos, o jovem por sua vez, em lugar de proteger a irmã resolveu violá-la.
A criança depois de sentir uma diferença no corpo, foi ter com a sua tia e esta fez questão de mandar informar o pai da menina. O progenitor da criança, depois da sua chegada à casa, levou o filho à polícia de Empada. Quando a corporação local decidiu enviar o processo para o tribunal regional, o pai quis recuar, pedindo que o caso não fosse transferido, sustentando que levou o filho apenas para ser repreendido pela policia. Mas as autoridades não estiveram com “meias medidas” e mandaram o caso para Buba, onde o jovem estava detido. A nossa reportagem tentou saber junto dos activistas dos direitos humanos do sector se o violador estaria ainda detido, mas ninguém tinha tal informação.
No mesmo mês de Novembro de 2015, na tabanca de Gã Disselis, aconteceu outra situação do género. Um jovem de 35 anos de idade com mulher e filho violou uma menina de 14 anos, aproveitando-se da trovoada e chuva que se faziam sentir no momento, para abusar da adolescente, tapando a boca da vítima com as mãos.
Apos a acção do individuo e passado a trovoada, a menina conseguiu gritar e as pessoas acorreram ao quarto onde se inteiraram do sucedido. Quando ela começou a relatar o que lhe aconteceu, a mesma pessoa, ainda de cuecas, foi assistir também, mas como a adolescente o tinha visto em cuecas durante o ato de violação, ela reconheceu logo o rapaz e denunciou-o às pessoas graças à peça de roupa.
O violador refutou no momento as acusações, mas os familiares da menina moveram uma intimação contra ele junto a policia sectorial. Na polícia o jovem foi questionado pelos agentes do motivo de ser a única pessoa a ser apontada pela menina, respondeu que tinha ido ver se as crianças já dormiram ou não, porque chovia, acabando por ser preso pela polícia.
Outro caso da violação foi cometido por um cidadão estrangeiro contra uma criança de cinco anos de idade dentro da cidade de Empada.
A reportagem do jornal “O Democrata deslocou-se até a residência do activista dos direitos humanos para saber na sua opinião sobre o motivo daquela onda de violação de menores. No entender do também professor de liceu local, Cesário Quartel da Silva, considera que a falta de denúncias por parte da população está na base do aumento de abusos de menores no sector.
“Muitos casos de crime não chegam às mãos das autoridades e ficam somente entre familiares, sobretudo os de violações de menores. Não são denunciados. Muitas vezes escondem esses fatos, só porque o criminoso é famíliar da vítima e os familiares preferem ficar calados com o assunto. Por vezes o abusador tem relação afectiva com a família da vítima. Se continuar assim, sem denuncias nem punições, este tipo de crimes continuarão a multiplicar-se”, alertou professor Cesário, acrescentando que os casos do género devem ser denunciados às autoridades competentes, sendo estes os agentes certo.