“Foi um erro que todos nós cometemos. Em democracia também se cometem erros e espero que o povo guineense saiba corrigir o erro que cometeu. Não há aqui uma questão de incompatibilidades, de Domingos não se entender com o fulano. Eu tenho potencial para não me entender com todos, mas também tenho potencial para me entender com todos”, referiu.
Sobre a alegada corrupção que o Presidente José Mário Vaz referiu ao demitir o seu governo, Domingos Simões Pereira disse que José Mário Vaz não tem condições morais para falar da luta contra a corrupção. Acrescentou ainda que a Guiné precisa de se credibilizar, de credibilizar a sua administração pública, mas que a condução do processo tem que ser feita por homens íntegros e por gente que granjeou reconhecimentos morais que lhes permitam fazer este exercício.
O Democrata (OD): Como é que o PAIGC vê a nomeação de Umaro Sissoco ao cargo do Primeiro-ministro?
Domingos Simões Pereira (PSP): Quando estivemos a discutir, a nível do PAIGC, no congresso de Cacheu, tentamos perceber quem tinha melhores ideias para este país. Quando saímos de Cacheu e fomos para as eleições legislativas, passamos a discutir sobre que partido tinha melhor projecto para o país. Ficou assim desenhado que, para que o povo tivesse garantias, quem fosse colocado a frente dos desígnios do país deveria ter um projecto de sociedade que pudesse melhorar as nossas condições de vida.
É disso que nós estamos a falar agora? Estamos a falar de ganhar um prémio… você sai pelo mundo fora ou vai tratar de outras coisas e, de repente, ganhou uma lotaria e é chefe do Governo. Isso é desrespeitar o fundamento da nossa existência enquanto Estado. Não se trata do problema do Sissoco. Por isso, não falo de pessoas, falo de princípios.
Sabe as ideias do Umaro Sissoco sobre o problema do sector da reforma e segurança? Sabe alguma coisa escrita por ele ou defendida por ele sobre esse sector?… Sabe o que ele pensa em relação ao combate ao narcotráfico? Tem alguma ideia do projecto que ele propõe em relação, por exemplo, à questão do desporto? Sabe-se alguma coisa sobre ele neste sentido?… se não sabe, então como pode o povo confiar nessa pessoa os destinos da Nação?!
Quais foram as entidades que concorreram para governar o país? Foram o PAIGC, o PRS, o PCD e por ai além. O povo outorgou a competência ao PAIGC. Essa competência de poder governar, por algum motivo foi posta em causa, e foi posta em causa pelo Presidente da República e dos alcoólicos que ele vai recrutando.
O Presidente da República, de acordo com a Constituição, tem como única competência verificar se há equilíbrio no exercício dos poderes e que a democracia funcione.
Se ele chegar à conclusão em como não há condições para que esse equilíbrio prevaleça e para que a democracia funcione, então ele apenas tem uma alternativa que é dissolver o parlamento e convocar eleições antecipadas. Quando ele disse que não faria isso, assumiu as competências que a lei não lhe conferiu. Portanto esteve fora da lei. Ele disse que havia gente que queria! Não, não…Quem violentou a lei e quem está realmente numa logica de golpe de Estado é o Presidente da República, o Dr. José Mário Vaz.
OD: Quem é realmente Umaro El Mokhtar Sissoco Embaló para o PAIGC?
DSP: É muito importante dizer uma coisa. Nós lançamos um processo do recenseamento e cadastramento dos nossos militantes. Eu acredito que esse é um exercício que vai nos permitir no futuro responder a essa pergunta com algum rigor. Até lá, muitas vezes são especulações, e muitas vezes são a sua palavra e contra a minha… Eu já ouvi alguém dizer que foi dirigente do partido e que chegou a membro do Comité Central. Respeito isso. Não tenho elementos para confirmar que assim foi, mas acredito que tenha sido.
Neste momento diz que é militante do PAIGC. Eu só me lembro do seguinte: para ser militante do PAIGC, não basta ter um cartão do partido. É preciso cumprir um conjunto de pressupostos. Neste momento, enquanto falo, não tenho razões para dizer que não cumpre, mas também não tenho elementos para garantir que cumpre.
OD: Em Fevereiro próximo, o Eng. Domingos Pereira completará 3 anos como líder do PAIGC. Olhando para as crises que abalam hoje o partido, com destaque para a dissidência do grupo dos 15, o que terá falhado na sua estratégia de assegurar a coesão interna?
DSP: Nada falhou! Obviamente que haverá sempre elementos ou coisas que nós podíamos fazer de forma diferente. Mas se rodarmos a cassete para trás, provavelmente voltaríamos a fazer exactamente a mesma coisa. Hoje o partido está muito mais coeso. Alguns dos senhores que estão cá assistiram, de alguma forma, a nossa última reunião do Comité Central, onde houve um debate franco e aberto. Não há unanimismo e nem todo o mundo pensa igual ao líder do PAIGC, mas no final do dia somos capazes sempre de tomar decisões que respeitam e protegem os interesses do partido.
Depois de Cacheu, ainda não aprovamos nenhuma decisão no órgão superior do partido com uma taxa inferior de 90 a 95 por cento. Isto é uma aquisição muito importante. Penso que o jornalista esteve na última reunião do Comité Central, quando optei por não intervir antes da votação. O que devia ser normal, enquanto o líder do partido, antes de submeter qualquer tema à votação devia ter o direito de poder dizer aos membros qual a posição defendida pela direcção do partido.
Optei pelo não! Disse que deixaria as pessoas definirem livremente a sua orientação e defenderem aquilo que pensam que é melhor para o partido. Em 212 membros presentes na sala da reunião, 11 pessoas votaram contra a resolução final. E nós continuamos a dizer que o partido está quebrado! O partido está numa rotura, não sei o quê… vamos com calma e vamos ver quando chegar o momento. Eu tenho muita curiosidade em ver se os outros partidos vão apresentar uma coesão maior.
Eu penso que há muita gente está a ficar com medo daquilo que o PAIGC está a demostrar, porque o testemunho que eu ouvi foi de gente que neste momento exerce cargos administrativos. Têm-me dito. Mas se o problema é o cargo que exerço, eu colocá-lo-ei à disposição para que o partido realmente saia bem.
Para podermos, de facto, manter esta coerência e resgatar o nosso país, temos de fazer sacrifícios. As pessoas estão muito preocupadas. Acho que é perfeitamente normal que estejam preocupadas com a questão dos 15. Mas quem são os 15? Os 15 são, de alguma forma, um instrumento que o Dr. José Mário Vaz gostaria de utilizar dentro do partido para poder destabilizá-lo.
As decisões que foram tomadas no partido foram decisões muito concretas e muito assertivas. Essas questões colocaram-lhes fora da condição de poder comprometer a condução do partido. Há um nervosismo crescente e, portanto como do outro lado está um Presidente da República, é normal que esse seja um assunto que não passa. Cada vez que há um pequeno problema fala-se dos 15. Quem se interessa com os 15 é o Presidente da República, porque ele é o promotor dos 15.
Agora pergunto-lhe, no passado não tem informação do que o ex-presidente do partido e o Presidente da República da Guiné-Bissau, João Bernardo Vieira “Nino” foi expulso do partido? Não têm essa informação? Não têm informação do actual primeiro vice-presidente do PAIGC, Carlos Correia ter sido expulso do partido? Não têm informação de que vários altos dirigentes do partido foram expulsos do partido. Porque é que essas pessoas foram expulsas do partido e porque é que estas agora não podem ser expulsas?
OD: Senhor presidente considera-se uma vítima do sistema tanto do partido como o do país?
DSP: Eu não me considero uma vítima. Estou no PAIGC com um propósito. Sou um cidadão nacional e a minha maneira e de acordo com a minha visão, quero o melhor para o meu país. Quero viver aqui! Eu acredito que aquilo que acontecer ao país, vai-me acontecer-me a mim e vai acontecer às pessoas de quem eu mais gosto.
Isto é uma luta e eu acredito que já estivemos mais longe. Eu compreendo a população e compreendo acima de tudo muita gente que se diz cansada! Mas não acredito que essas pessoas estejam a dizer que querem que esta situação seja recorrente. Eu penso que desta vez, durante este exercício, por mais difícil que a situação esteja e, sabemos que está, há um grande ganho que podemos retirar da actual crise. Estamos a utilizar um método exclusivamente democrático.
Recorremos à lei. Através do confronto político, estamos a fazer valer os nossos direitos e os nossos interesses. O que está a desequilibrar este exercício é sobretudo um ou dois factores: um dos factores é o Presidente da República ser um actor político, o que não deveria estar a acontecer. Na nossa constituição, o Presidente da República não é parte do jogo político.
O Presidente da República deve ser o fiel da balança. A segunda grande razão para este “sentimento” é o tempo. Isto está a durar muito, o que está a provocar muitos desgastes. É próprio da natureza humana pensar que se eu estiver a sofrer disto durante muito tempo, então qualquer solução serve. Não! Não, nos serve qualquer solução. Devemos ser capazes de sair desta situação vencendo os fantasmas do passado. Não podemos admitir que a indisciplina vença a disciplina!
Não podemos permitir que um grupo de pessoas continue a poder condicionar o exercício de uma instituição. Lembro-me que muitas vezes as pessoas perguntam: porque não negociam com os 15? Fizemos isso. Sabe, essas negociações redundaram em quê?…qual é o lugar que me vão dar no governo e qual é o lugar que dão àquelas pessoas que me acompanham? É este o país que queremos construir?
OD: O seu ex-aliado, Baciro Dja, no processo da conquista da liderança do partido, cedo tornou-se um adversário. Quais foram as causas que minaram a vossa aliança?
DSP: Penso que essa é uma pergunta que tem de fazer ao Dr. Baciro Dja. Porque é que eu digo isso? Porque foi ele quem apresentou a carta de demissão e a dizer que deixou de ter confiança para continuar a trabalhar comigo. Julgo que se lembram disso. Quando ele entregou a carta do pedido de demissão deu uma conferência de imprensa e disse que muito pouco tempo depois haveria uma mudança. Isso acabou por acontecer.
Dr. Baciro Dja, depois de ter pedid0 a demissão, menos de um mês depois o meu governo foi demitido. Portanto, ele estava na posse de informações que diziam que se ele demarcasse dessa governação teria uma recompensa. Essa é uma pergunta que tem que ser dirigida ao Dr. Baciro Dja, sobretudo nesta altura em que ele tem condições de comparar o passado com o presente.
OD: Muitos consideram o seu estilo de liderança tendente a favorecer os próximos e amigos e isso terá contribuído para ruptura interna no PAIGC. Qual é a sua opinião?
DSP: Essa definição de próximos e amigos é sempre muito parcial e muito subjectiva. Eu não partilho deste sentimento. Eu tenho que formar uma equipa capaz de produzir resultados. Não consigo compreender este sentimento. Eu vou dizer-lhe o seguinte: pertenço à uma geração que tem todo o direito de pensar que é a primeira geração dos escolares guineenses.
Recebi uma bolsa de estudos para formação superior em 1981/82. Somos praticamente a primeira geração de técnicos guineenses que receberam essa oportunidade de formação. Portanto é perfeitamente normal que haja aqui alguma coincidência, com grande parte daqueles que conheço. Se acredito que podem produzir determinadas soluções, podem pertencer ao meu governo.
Penso que o debate devia ser dirigido noutro sentido. Por exemplo, dizer que optei por ‘A’, quando tinha opções ‘B, C e D’, que são muito melhores do que a opção ‘A’. Ou que fui buscar alguém fora, quando dento do partido tinha essa mesma competência. De facto, houve coincidências. Alguns que foram membros do meu governo são da minha geração e podem ser considerados meus colegas, eventualmente meus amigos.
Tenho muito orgulho do desempenho que eles fizeram, mas há uma generalização nisso que não corresponde à realidade. Bom número daqueles que são hoje apresentados como os meus colegas e meus amigos, eu conheci-os já neste percurso de candidatura à liderança do partido. Só que eu gosto de mobilizar competências. Acredito que sempre que encontro alguém no meu percurso, que me pareça competente, tento que puxá-lo.
O partido, talvez durante demasiado tempo orientou-se na perspectiva de “quem fez campanha merece ser recompensado”. Muita gente pensa: estou na sede durante esse tempo todo. Considero-me ‘Rei da Campanha’ política e agora não me colocaram a mim e foram colocar o fulano ou beltrano.
Que me dêem exemplos concretos de gente que eu coloquei no governo por serem meus amigos e que um (1) não sejam do partido, dois (2) que não sejam do sector onde foram colocados.
Dos 31 membros do meu governo, há quatro que podem ser vistos como os meus colegas, a quem reconheço competências e qualidades que me garantem resultados. O que é interessante no meio disso tudo é que as acusações são parciais e fragmentadas. Num momento dizem que são amigos e colega foi por isso e, noutro momento vo dizem que você tem prolemas com os muçulmanos e não sei o quê… mas quando dizem isso não vão reconhecer que dentro desses amigos há muçulmanos e de todas as outras proveniências. É desonesto este sentimento, porque vejo em todos os guineenses homens e mulheres iguais a mim.
Quero dar um exemplo que me parece verdadeiramente demostrativo. Nós elaboramos um plano estratégico operacional. Posso considerar que foi um exercício excepcional. Vá verificar quem são as pessoas que contribuíram para a elaboração do documento. Portanto são pessoas que ficavam nesta sala, às vezes até às cinco da manhã outras vezes até às seis da manhã. Essas pessoas tinham de ir aos seus empregos às 8h:30 ou nove horas da manhã para trabalhar.
Qualquer governo é feito de equipas, são equipas de trabalho. Depois de criticarem tanto o que fizemos e se o governo era feito sobretudo dos meus amigos, afinal foram os meus amigos que escreveram isso. Afinal tinham competência para escrevê-lo. Agora saíram e entraram os amigos dos outros. Onde é que está o produto de trabalho que eles fizeram? Chegaram e ali descobriram que o produto de trabalho dos meus amigos é que era bom.
OD: A sua demissão das funções do Primeiro-Ministro depois de um ano de governação resultou da ausência de um ambiente saudável de coabitação com o Presidente José Mário Vaz. Qual foi na verdade o principal motivo de tensão entre vocês?
DSP: Não houve um motivo de tensão, mas houve sim uma diferença de abordagem. O Presidente da República, Dr. José Mário Vaz, na minha opinião tem uma percepção e uma leitura completamente desenquadradas do nosso ordenamento jurídico e político. Na nossa Constituição e no próprio espirito da Constituição não está consagrado que os demais órgãos de soberania têm de ser do agrado do Presidente da República.
Quando o Presidente da República invoca que eu não o respeito e que temos dificuldades em trabalharem em conjunto, na verdade eu nunca senti que nós trabalhamos, o Dr. José Mário Vaz e eu, porque ele (José Mário Vaz) não discute substâncias. O Dr. Mário Vaz ocupa o seu tempo naquilo que lhe vão dizendo e nas percepções. Houve uma ocasião em que eu entrei no gabinete do Presidente José Mário Vaz e ele recusou apertar-me a mão, porque alguém lhe disse que, se me apertasse a mão alguma coisa poderia acontecer. Isto é alguma substancia… são coisas dessa natureza.
Consigo desculpar isso, consigo colocar-me por cima disso! Muito rapidamente compreendi que o Presidente José Mário Vaz tinha uma agenda. Ele acredita que terá capacidade de chamar a si todas as competências do país. Ele acredita que verdadeiramente que vai poder controlar o Supremo Tribunal de Justiça e acredita que vai controlar Assembleia Nacional Popular. Acredita que pode controlar o Governo e vai ter capacidade de influenciar a sociedade civil.
Quero lembrar aqui uma coisa interessante: Eu e o camarada Carlos Correia fomos à casa do José Mário Vaz, antes dele se mudar para o Palácio da República. Ele tinha convocado o Secretário Nacional do PAIGC, e algumas estruturas do partido para uma reunião em sua casa. Achamos estranho e assinalei que isso não me parecia normal, mas ele entendeu que, sendo o Presidente da República e sendo militante ou ex-militante do PAIGC, não sei como tratá-lo, ele tinha o direito de ter uma capacidade de influenciar o que vai acontecendo no PAIGC.
Tanto assim foi que, na escolha dos membros do Conselho de Estado, o número de elementos do PAIGC que ele colocou no Conselho do Estado indicava que ele queria poder influenciar as coisas dentro do partido. Chamei-lhe atenção na altura, disse-lhe que os cinco elementos que o Presidente da República tem o direito de convidar para o Conselho de Estado são escolhidos de forma de permitir que o Presidente tenha uma maior representatividade da Nação guineense.
Os órgãos de soberania representados no Conselho de Estado são o Presidente da Assembleia Nacional Popular, o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, o Primeiro-ministro e os líderes dos partidos representados no parlamento que têm assento por inerência. Depois disso, verifica-se depois os restantes cinco assentos a preencher. Deve ser tomada em conta a questão do género, se uma mulher foi convida ou não. Se todas as religiões estão representadas, se o sector privado e a juventude estão representados. É assim que os cinco membros são cooptados como uma forma do Presidente garantir a representatividade.
Para o Presidente José Mário Vaz não era isso. Nos cinco elementos que ele tinha direito, e colocou quatro do PAIGC. Pretendendo ter uma verdadeira ascensão dentro do partido, mas ele não ficou por aí. O Presidente Mário Vaz, antes de tomada de posse do Governo, chamou-me numa determinada ocasião à casa dele para me apresentar ao Governador do BCEAO. Anunciou-me que estava a negociar uma dívida para o pagamento de salários. Estava a negociar em casa dele e o executivo ainda não tinha tomado posse.
Eu disse-lhe que eu ainda nem o meu ministro das finanças conhecia e como é que ele estava a negociar uma dívida. Perguntei ainda com base em que prossupostos estava a negociar a dívida e qual era a taxa de juros que estava a negociar. Qual era a condição de reembolso? Ele respondeu que eu ia chegar ao poder e não sabia o que encontraria. Respondi-lhe que eu não sabia, e se ele sabia. Ele respondeu que foi o ministro das finanças e que conhecia melhor a situação…
Isso é uma autocritica e ao mesmo tempo um reconhecimento de culpa que tivemos. Nós colocámos na Presidência da República, que é o mais alto cargo da magistratura nacional, alguém sem preparação para o efeito. José Mário Vaz não tem preparação para ser o Chefe de Estado, não tem… foi um erro que nós todos cometemos. Em democracia também se cometem erros. Eu espero que o povo guineense saiba realmente corrigir o erro.
Não há aqui uma questão de incompatibilidades, de Domingos não se entender com o fulano. Tenho potencial para não me entender com todos bem como tenho potencial para me entender com todos. Da mesma forma que o Presidente pode ter alguma dificuldade de relacionamento comigo, eu posso ter dificuldades de relacionamento com outro. Mas isso não me dá o direito de pensar que, porque não nos entendemos, você tem que sair!
Não está escrito na Constituição que, para trabalharmos juntos, temos que ser amigos. O importante é respeitar a ordem constitucional e seguir os procedimentos que estão ai aditados.
OD: O senhor tem um problema pessoal com José Mário Vaz?
DSP: Que eu saiba não! Nunca tivemos nada cruzado… José Mário Vaz já se referiu a minha família publicamente, muitas vezes. Já evocou situações que tinham a ver com o meu filho, que tinham a ver com a minha mulher. Eu não, tudo que tem a ver em relação à família de Dr. José Mário Vaz é que eu a respeito. Eu tento distinguir os dois momentos: Há um que exerce competências de Estado e nesses exercícios das competências, podemos não nos entender. Posso ter uma leitura crítica em relação ao resto da família e em relação à intimidade de Dr. José Mário Vaz. Eu sou religioso e respeito o direito que cada um tem a sua privacidade e ao seu bom nome.
Quero lembrar aqui três momentos que considero extraordinários nesta andança e isso é para responder à questão, se tenho problemas com o Dr. Mário Vaz. Primeiro, quando o Dr. José Mário Vaz foi escolhido como candidato presidencial do PAIGC, nós dois juntos fomos fazer a deposição da candidatura no Supremo Tribunal de Justiça. Logo depois da deposição da candidatura, o então Procurador-Geral da República apresentou um recurso dizendo que pendia sobre o Dr. José Mário Vaz um conjunto de suspeitas que não lhe outorgavam o direito de ser candidato.
Quem foi ao Supremo Tribunal de Justiça defender o Dr. Mário Vaz fui eu. Porque fiz isso? As pessoas podem perguntar se eu estou arrependido disso, não estou arrependido. Eu li o texto que invoca as razões por que o Dr. José Mário Vaz não podia ser candidato. Eu disse que aquelas razões eram extemporaneas, porque apresentar como candidato foi buscar uma certidão de registo criminal e a entidade que deu registo criminal escreveu ‘Nada Consta’.
E a única dificuldade que depois tive com isso foi quando o Dr. José Mário Vaz recusa a outras pessoas esse mesmo princípio. A seguir, a Comissão Nacional de Eleições (CNE) fixou um prazo que nós achamos que era muito apertado para entrega de um conjunto de documentos, sobretudo para o nosso candidato presidencial. Quem foi a CNE fui eu, não foi ele. Eu é que fui a CNE e eu é que fui ter com o Presidente de Transição, Serifo Nhamadjo, para conseguirmos a dilatação do prazo. Esses são dois sinais importantes para demostrar que não havia nenhum problema entre nós dois, pelo menos que eu soubesse.
Penso que todos devem se lembrar, que quando foi lançada a campanha eleitoral nacional, eu estava fora a correr o mundo, a ver se conseguia apoios para a campanha eleitoral do PAIGC. Durante as duas semanas que eu passei fora da Guiné, onde é que o Dr. José Mário Vaz fez campanha? Em Bissau apenas. José Mário Vaz não passou de Safim em campanha eleitoral. Porquê? Porque tal restrição colocada pelo Procurador-Geral da República continuava a colocar esse medo de o fazer.
No dia em que eu cheguei a Bissau, que subimos numa plataforma até a sede do partido. Foi esse o dia que saímos para o interior e fizemos 23 dias de campanha. Se eu tivesse algum problema com o José Mário Vaz provavelmente não faria isso. Já com o anúncio do resultado das eleições, havia o problema de aceitação do resultado. Isso porque o candidato Nuno Nabiam não queria reconhecer o resultado. O presidente Ramos Horta convida-nos para uma negociação na UNIOGBIS para ver se conseguiamos ultrapassar aquela situação.
O que é que nos foi proposto? Fizeram-nos uma proposta através de um documento escrito. Aceitar Nuno Nabiam como vice-Presidente da República e responsável pelas áreas económicas.
OD: Qual foi a resposta do Presidente José Mário Vaz, na altura?
DSP: Estava presente não só José Mário Vaz, mas também o camarada Carlos Correia. A posição de José Mário Vaz foi de aceitar a proposta feita por José Ramos Horta. Nós é que recusamos e dissemos na altura que isso não estava plasmado na nossa Constituição.
A saída dessa reunião, eu é que liguei pessoalmente ao Nuno Nabiam, instando-lhe a aceitar o resultado das eleições e que a seguir teríamos uma reunião no Palácio da República. José Mário Vaz optou por não falar. Eu assumi as despesas de defender a sua posição para a sua eleição. Isso não me faz arrepender-me, porque eu não estava a defender o Dr. José Mário Vaz. Eu estava a defender um princípio, mas acima de tudo defender a Constituição e as demais leis.
OD: O Presidente JOMAV baseou-se muito em alegações de corrupção como motivos para demitir o seu governo. Como avalia hoje as acções do Chefe de Estado contra corrupção na luta?
DSP: Eu penso que não existe nada. O Dr. José Mário Vaz não tem condição moral de falar da luta contra a corrupção. Esta é uma luta que a Guiné precisa desencadear. Nós precisamos de credibilizar a nossa administração pública, mas a condução desse processo tem que ser feita por homens íntegros e tem que ser feita por gente que granjeou reconhecimentos morais que lhes permitam realmente fazer este exercício. O combate à corrupção não se faz através das acusações infundadas. O combate à corrupção faz-se com outros ingredientes. Quais são esses ingredientes que eu acho que devem ser colocados para de facto haver um efectivo combate à corrupção?
Primeiro, precisamos ter critérios objectivos para seleccionar os nossos prestadores públicos de serviço. Segundo, precisamos criminalizar todos os actos que lesam o bem público. Não conhece um documento oficial, em que alguém, em representação da `Empresa JOMAV´, confirmou estar em divida com o pagamento de fisco. Escreveu um documento a dizer que iria pagar um milhão por mês até liquidar a dívida de 600 milhões de francos cfa. O sentimento atrás disso é que ele assumiu que pagaria a dívida, mas o problema não era esse. O problema é que a Constituição da Guiné-Bissau diz que quem deve ao Estado não pode servir o Estado.
Você está a imaginar que vamos entregar a responsabilidade de, em nosso nome, gerir o património público à alguém que tenha uma situação desta natureza?! Estamos a espera de quê? Revisitem o meu discurso de tomada de posse. Propus que todas as pessoas nomeadas para exercer cargos publicos passassem por uma comissão da ética. É importante criar uma comissão da ética que possa passar a pente fino o nosso percurso e identificar eventuais situações impeditivas do nosso exercício do cargo público. A comissão até foi criada, porque é que não se funciona? O combate contra a corrupção não pode ser visto como uma luta de antecipação.
Para já não há problema de fosfato, de bauxite, da areia pesada de varela e do petróleo… alguém o perguntou? O Presidente da República convocou o primeiro-ministro na altura e disse-lhe que a zona de exploração conjunta entre a Guiné-Bissau e o Senegal que ele tinha suspeitas da utilização desses recursos. Eu respondi-lhe que eu não faria essa gestão, que era uma estrutura autónoma e independente. Se o Presidente quisesse poderia convoca-los e eles viriam apresentar as contas, mas nós não tinhamos rigorosamente nada a ver com aquilo.
O Presidente insistiu dizendo que queria transparência na gestão desse fundo. Eu disse-lhe que achava que ele estava a cometer um erro, porque essa direcção ocupava-se de duas componentes. Uma era das pescas e a outra era da pesquisa petrolífera. Essas duas componentes eram competências do Governo, mas se o quisesse se ocupar-se disso, eu não tinha nenhum problema. Mandei buscar todos os documentos e levei-os para ele na Presidência da República.
Desde então alguém ouviu a falar disso? Eu vi foi o Presidente da República a entregar um cheque de 500 milhões de francos cfa ao seu novo primeiro-ministro Baciro Dja, para construir uma avenida. Alguém perguntou da avenina? Alguém perguntou dos 500 milhões de francos cfa? Alguém perguntou se o dinheiro que veio era só 500 milhões de francos cfa?
Eu vi na televisão outra vez o projecto de “Novo Bissau”. Isso é da competência de Presidente da República? Um projecto que até pode ser futurístico… lembro-me que nós analisamos esse projecto na reunião do Conselho de Ministros e demos a nossa orientação de como é que esse projecto poderia e devia ser tratado. Tínhamos vários projectos dessa natureza. Só que a diferença com o Presidente da República é que nós queríamos começar por Cacheu, Bolama e Bafatá antes de fazer o projecto dessa natureza em Bissau.
OD: Já agora, Senhor Eng. tem um processo crime em curso no Ministério Público?
DSP: Que eu saiba não. Não fui nunca notificado de qualquer coisa. Até este momento não conheço nenhum processo-crime contra mim.
OD: A dupla JOMAV/DSP apresentada aos eleitores guineenses defraudou as expectativas. Como explica esse fracasso?
DSP: A dupla é um “slogan” de campanha. No nosso regime constitucional não pode haver duplas. Esse conceito de `suplas´ é nos modelos anglosaxonicos, sobretudo na constituição norte-americana, onde há um candidato presidencial e há um vice-presidente que o acompanha. Aqui foi mais aquela colagem, até erradas. Penso que foi um erro de campanha, apesar de ter funcionado durante algum tempo.
Penso que foi um erro, porque quando propomos um candidato à Presidência da República, ele deve ser apolítico. Não deve e não devia ter se colado a um partido político. Penso que todo o mundo compreende que na altura em que o Dr. Mário Vaz foi apresentado como o candidato, ele era pouco conhecido no seio da nossa população. Eu não estou a dizer que eu era mais conhecido, mas tendo feito a campanha que eu fiz para a liderança do PAIGC e estando a falar em nome do PAIGC, eu já levava alguma vantagem nesse aspecto.
OD: O PAIGC é um partido minado por divergências profundas. O senhor não teme que essas divergências internas conduzam a uma derrota nas próximas eleições legislativas?
DSP: Estou aqui enquanto presidente do partido a dizer-lhes que os órgãos superiores do partido nunca estiveram mais coesos do que hoje. Eu não sei que tipo de outras evidências preciso realmente apresentar…deixam-me apresentar mais uma. Vocês sabiam que no ano 2015, ou seja, no exercício de 2015, o número de reuniões do Comité Central que fizemos é superior a somatória de todas as reuniões que foram feitas pelo Comité Central em mais do que uma legislatura completa?
O que é que configura essa crise interna que sistematicamente de que temos que falar. Parece que adoptámos aquilo que é o ‘slogan’ dos 15 e do Presidente da República, e encaixamo-lo no PPAIGC. O PAIGC respira saúde e no nosso entender respirar saúde não significa unanimismo. Não há crise no PAIGC. Há sim uma crise junto do Presidente da República e dos 15. O que eu posso aceitar é que há entidades que gostariam de ter instrumentos dentro do partido, mas que neste momento não têm. Não tenho duvidas que o povo percebe isso.
Aos órgãos da comunicação social que realmente afinem essa linguagem porque é penalizante e desequilibrada. Os 15 não são um partido político. Os 15 são ex-elementos de um partido e que foram sancionados. Nós estamos a priorizar a disciplina e a instituição. Estamos num processo de recenseamento e neste momento estamos a estimar em cerca de 180 mil o número de cidadãos guineenses que se consideram afectos ao PAIGC.
OD: Como avalia o regresso dos exilados políticos ao país, com destaque para Carlos Gomes Júnior?
DSP: Antes da ida ao Cacheu ao congresso, eu já dizia que enquanto houver um cidadão guineense no estrangeiro, impedido de regressar por razões políticas, isso significa que nós não estamos a viver em plena democracia. Eu sou à favor do regresso incondicional de todos os cidadãos nacionais ao país. E tenho dito isso: sou responsável, portanto tenho também que ser responsável a avaliar objectivamente se há condições para esse efeito.
Há pessoas que saíram do país não por livre vontade. Foram obrigadas a tal, portanto o seu regresso tem que ser avaliado no sentido de, primeiro criar-se condições para que a sua segurança seja de facto preservada e que a sua presença não represente qualquer tipo de ameaça a outras pessoas. É nessa perspectiva que eu, enquanto primeiro-ministro, levantei essa questão junto da CEDEAO e pedi a intervenção da CEDEAO para esse efeito. Tive duas reuniões com os ministros em exercício do Conselho de Ministros da CPLP, nomeadamente o ministro de Angola e o ministro de Moçambique, discutindo essa questão.
O que eu sinto hoje é que convinha que a abordagem desta questão fosse realmente por preocuparmo-nos com essas pessoas e não preocuparmo-nos com nós próprios. Há muita gente que, para ter uma relevância no espectro político actual, pensam que devem trazer outros condimentos, isto que é mau. Eu não acho normal que o Carlos Gomes Júnior seja transformado num facto político, porque há pessoas ou entidades que pensam poder beneficiar disso. Eu digo isso com tremenda responsabilidade, porque eu sei aquilo que isso configura.
Um caso concreto é quando o ex-Chefe de Estado-maior Zamora Induta regressou. O Presidente da República afirmou publicamente que o Governo é que teria sido responsável pelo regresso dele e que a intenção da vinda do Comandante José Zamora Induta seria para preparar o regresso de Carlos Gomes Júnior. Quando Zamora Induta regressou, significou a preparação da vinda de Carlos Gomes Júnior e isso foi tido como um crime. Hoje é inverso, portanto eu não vejo muita seriedade nisso.
Espero que as instâncias competentes trabalhem de forma séria na criação de condições para que todos os cidadãos guineenses possam realmente, se assim entenderem, voltar ao seu país e poderem viver tranquilamente. Espero que essas pessoas no exterior e as suas famílias saibam analisar de forma fria e ponderada a existência ou não dessas condições.
OD: As relações pessoais com o líder do PRS, Alberto Mbunhe Nambeia, eram excelentes antes da queda do seu governo. O que terá comprometido as vossas relações?
DSP: Eu não sei e penso que essa é uma das perguntas que tem que ser colocada ao presidente do PRS. E o que eu posso dizer é o seguinte: até hoje tenho muito respeito por Alberto Nambeia. Infelizmente hoje não posso dizer que tenha realmente muita confiança no Alberto Nambeia, o que não altera o respeito que continuo a ter por ele. Penso que há aqui uma coisa que aconteceu, e não estou a dizer que seja a razão da nossa ruptura, porque a dado momento eu ouvi duas coisas.
A primeira coisa que eu ouvi foi que o PRS tinha os seus próprios interesses e que esses interesses tinham que ser sobrepostos a todos os outros. Há uma outra argumentação de que um presidente é um presidente, então vá se lá saber o que é que isso quer dizer… eu penso que o que falhou terá sido a nossa capacidade de demostrar à Nação guineense que o pacto social que nós estávamos a propor era demostrar ao povo guineense que o pacto social que nós estávamos a propor era algo muito importante para este país.
A luta político partidária é muito importante, mas nos seus momentos. Terminamos as eleições e vamos começar uma governação. Eu entendi e eu convenci as pessoas dentro do partido que era importante termos quatro anos a pensar na governação e não a pensar nas guerras políticas. Achei ter compreendido que um partido como o PRS ou partidos com assento parlamentar, quando entendem que têm capacidades de influenciar quem tem o poder, poucas vezes se alinham nessa vocação.
Eu pensava que a minha maior dificuldade seria dentro do PAIGC, em convencer os dirigentes do partido a aceitar outras entidades. Fiz questão de fazer-me acompanhar do presidente do PRS em vários momentos decisivos para a vida do nosso país e um dos exemplos é a reunião da Assembleia das Nações Unidas a que fomos juntos. Há um elemento que eu penso que é muito importante. Não foi tão público e as pessoas podem não saber.
O presidente do PRS era recebido no Gabinete do primeiro-ministro todas as quintas-feiras, antes da reunião do Conselho de Ministros, ou seja, os temas do Conselho de Ministro que iam ser debatidos e que poderiam representar algumas reformas estruturais, tinha sempre a atenção do comunicá-los ao líder da oposição. Penso que falhamos em muitas coisas, mas isso não quer dizer que eu abandonei a minha convicção de que este país precisa de um contrato social.
Eu não acredito na política de “soma zero”. A política em que para um ganhar e outro tem que perder. Podemos ganhar os dois ou os três ou mais ainda, desde que haja critérios para esse efeito. Eu não tenho nada a assinalar ao presidente do PRS, antes pelo contrário, dei testemunhos do momento que nos marcaram.
Infelizmente quem não quer o bem e quem não quer ver esse país para a frente tratou de incendiar as hostilidades. Será que isso me faz perder a esperança de amanhã podermos trabalhar? Não! Quem está na política tem que acreditar que se não funcionou hoje, é possível funcione amanhã.
OD: E-mails (correios electrónicos) foram publicados num conhecido blogue, a dar conta de informações sobre tráfico de influência que alegadamente envolveu o DSP, seus próximos e algumas figuras da imprensa nacional. Qual é a sua opinião sobre esses e-mails?
DSP: Primeiro é preciso que o povo guineense e, aliás, todos tenhamos consciência de que se trata de um crime. Violar a privacidade de uma pessoa e tentar por via dessa violação tirar proveitos ou vantagens nomeadamente políticas. Não devia merecer nenhum apreço ou nenhum reconhecimento da parte de pessoas sinceras e leias. Outro aspecto que eu considero de extrema gravidade é que algumas entidades e até oficiais se posicionaram muito próximas disso. Não sabemos quem é que tentou entrar na minha privacidade, ou melhor, quem é que a violou.
Quando ouvimos algumas entidades fazer referência a isso, meteu-nos medo de admitir que podemos chegar ao ponto de entidades oficiais deste país fazerem uso de ‘hackers’ para violar a privacidade e poder com isso tirar vantagens. Quero referir-me a um ou dois dos meus e-mails que foram publicados. Há um e-mail que eu enviei à minha assistente administrativa dando instruções sobre um conjunto de pagamentos que deviam ser feitos. É um e-mail em concreto que eu conheço e quando me falaram desse e-mail, meio a brincar, disse se aquilo era tudo o que tinham de mim, então eu devia candidatar-me a Bispo ou Papa, porque realmente se era aquilo o que nos apontavam como tendo de errado, então que fizesse mais coisas erradas.
O e-mail que publicaram e pelo menos aquele que eu tive acesso e que eu mandei a minha assistente administrativa referia-se a pagamentos de doentes que deviam ser evacuados e que não tinham junta médica. Eu estava preocupado que eles ficassem cá muito mais tempo, sem a cobertura médica e medicamentosa. É claro que eles não foram em detalhes de precisar esses aspectos, mas eu desafio os órgãos de comunicação a irem e verem os detalhes dos nomes que estão lá, para verificarem que eram pessoas que eu não conhecia de lado nenhum.
Estamos a referir-me a um menino que caiu de um mangueiro e temia-se que ele tivesse partido o pescoço e que estava no hospital Simão Mendes. Estamos a falar de das duas meninas e uma das quais tinha uma barriga saliente, com quatro anos de idade. As duas foram operadas e estão bem. Na altura em que eu estava de viagem, lembrei-me de repente que não tinha conseguido tratar do assunto da evacuação dessas pessoas. Pedi que se fizesse a libertação de fundos e pedi à minha assistente administrativa que tratasse desses assuntos. Eles foram buscar o e-mail publicaram-no, mas tentaram esconder o conteúdo real do e-mail para simplesmente dizer temos provas de que fez isso e fez aquilo…Que tráfico de influência, quando estamos a falar de pessoas deitadas no hospital?
OD: O líder do PAIGC tem vindo a circular com duas grandes viaturas pretas. Foram compradas com o dinheiro de Estado da Guiné-Bissau, do partido ou do seu bolso?
DSP: Eu tenho três viaturas que eu utilizo neste momento. Tenho duas viaturas todo o terreno e tenho uma viatura Mercedes. Começamos por esta última, a viatura Mercedes foi-me entregue por responsáveis da Presidência da República com a notificação de que teria sido uma oferta do Rei de Marrocos ao deixar Bissau. Disseram que ofereceu uma viatura ao Presidente da República e outra a mim. Foi um dos assessores do Presidente da República que entregou as chaves ao meu chefe de segurança, referindo que era uma oferta do Rei de Marrocos.
Em relação às outras duas, foi em setembro de 2015, logo depois da minha demissão e logo depois do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça. Fui chamado à Dacar para encontrar-me com os Chefes de Estado da CEDEAO. De Dacar, o Presidente da Guiné-Conakry, Alpha Condé, chamou-me a Conakry para uma conversa. Fui acompanhado de várias pessoas.
Em Conakry, o Presidente transmitiu-me uma preocupação dos Chefes de Estado da CEDEAO, dizendo textualmente que compreendiam que o PAIGC tinha ganhado nas instâncias judiciais, mas tendo do outro lado um Presidente da República, gostariam de ter a minha colaboração para podermos ultrapassar a situação. A única coisa que lhes preocupava era a minha segurança e razão pela qual tomaram a diligência de me oferecer duas viaturas para melhorar a minha segurança. Essas duas viaturas foram compradas pelos Chefes de Estado da CEDEAO na altura da minha demissão de primeiro-ministro.
Nem as duas viaturas todos terrenos e nem a viatura Mercedes foram compradas por mim ou pelo Estado guineense. É claro que eles disponibilizaram dinheiro e nós fizemos a transferência. Aliás, as viaturas nem são novas, mas sim usadas, tendo em conta os valores que disponibilizaram.
OD: O Eng é amante de desporto, em particular do futebol. O Senhor vai ao Gabão para apoiar a selecção nacional? Que mensagem quer deixar aos dirigentes da Federação e aos guineenses em geral, nesta fase de preparação para o “CAN – 2017” no Gabão?
DSP: De ir ou não ir… se eu tiver a capacidade financeira e oportunidade, bem gostava de poder ir, porque é uma oportunidade impar. Eu ouvi o novo primeiro-ministro dizer que ia providenciar o transporte para os apoiantes da selecção. Espero merecer esse título de apoiante da seleção e poder beneficiar também dessa ida gratuita. Seria uma boa ocasião.
Antes de deixar a tal mensagem eu gostava de clarificar uma coisa. Eu não sei se vocês têm ideia dos valores que o meu governo desembolsava para cada o jogo da seleção. Estamos a falar numa média de 140 milhões de francos cfa por jogo. Eu disse que não me parece que esta seja a forma mais racional de utilizar esse dinheiro. Perguntei-me na altura o porque é de a gente não investir em infraestruturas de base. Que investíssemos na formação de técnicos e na reforma do nosso desporto. É claro que quem está a frente não gosta de ouvir isso, mas eu disse-lhes que não condicionaria as verbas enquanto estivéssemos na competição para chegar ao CAN, que daríamos todo o apoio. Se porventura fossemos eliminados, teria acabado, que pararíamos e começaríamos nas estruturas de base e até chegarmos ao topo.
Agora posso responder à sua questão, dizendo que o povo guineense tem todo o direito de sentir-se orgulhoso deste feito. Chegar ao CAN não é algo que acontece todos os dias a todos os países. O que eu espero é que, para além das vitórias desportivas, nós possamos associar a essa vitória algo que para mim é transcendental. Transformar essa ida ao CAN numa razão para a unidade nacional. A meu ver, não importa quem fez mais ou quem fez menos. O que importa é agora fazermos muito mais para que a nossa presença no CAN seja uma presença dignificante e que possa realmente honrar todos os guineenses.
– Fim-