Luís
Manuel Brás Bernardino é Tenente-Coronel de Infantaria do Exército Português,
Doutorado em Relações Internacionais, investigador e membro de direção da
Revista Militar. Tem vários livros publicados sobre os PALOP, com enfoque nos
setores da defesa e segurança.
Na
atualidade, qual o papel desempenhado por Portugal na manutenção da paz e
resolução de conflitos nos PALOP (Países Africanos de Língua Oficial
Portuguesa)?
Portugal
tem um papel muito importante na reforma dos setores da defesa e da segurança. Bilateralmente,
Portugal tem projetos de cooperação técnico-militar com todos os países de língua
portuguesa, que duram praticamente desde os Processos de Independência. Através
das suas Forças Armadas, participa ativamente na reforma dos setores da segurança
e da defesa, apoiando os Ministérios da Defesa Nacional, a estrutura de comando
das Forças Armadas, as próprias Forças Armadas, nomeadamente em termos
legislativos, organizativo e de apoio à formação. Multilateralmente, Portugal participa
através da CPLP (Comunidade de Países de Língua Portuguesa) no apoio à formação
das Forças Armadas e na área de cooperação do protocolo de defesa, mediante a
realização de exercícios, de fóruns de concertação… Também participa através de
outros organismos em África, na prevenção e resolução de conflitos, como a União
Europeia, Nações Unidas e NATO.
E no caso da CPLP, qual a capacidade de intervenção da organização
em termos militares?
A
CPLP tem uma ação direta na prevenção de conflitos. Possui mecanismos de
intervenção ao nível da prevenção, mediação e observação eleitoral… Mas ao nível
da gestão, peacekeeping, peaceenforcement, quando é necessário ter uma força
constituída para intervir diretamente num conflito, a CPLP não tem essa capacidade
e, possivelmente, não a terá a curto prazo. Para ter essa capacidade implica
possuir um mecanismo que por exemplo, a NATO já tem: nomeadamente uma força
mais estruturada, melhor dimensionada, treinada, interoperável,
interoperacional e com meios militares adequados.
Em
diversos países africanos é comum o envolvimento de militares em questões políticas,
incluindo nos PALOP. Até que ponto esta situação é benéfica em matéria de
defesa e segurança?
No
contexto africano, as Forças Armadas sempre participaram nos processos políticos.
As independências aconteceram à volta do ideal político, social e religioso,
mas envolvem quase sempre as Forças Armadas. Estas fazem parte da dinâmica
libertadora, de independência destes países, são instituições que se confundem
com o próprio Estado, como o poder e capacidade para influenciar e decidir. É
natural que estas pessoas que em determinados momentos assumiram estes dois papéis
– guerrilheiros/comandantes e líderes políticos – tenham um papel importante.
Penso que estamos a assistir a um período de transição, ao nascimento de uma
nova classe politica, que ainda tem associada uma forte componente militar. As Forças
Armadas tenderão a ter o seu lugar dentro de um Estado democrático e os políticos
a assumir os seus papéis dentro de um Estado de direito/político. Mas penso que
ainda vai levar algum tempo, umas décadas.
Falando
em Estado democrático, este ano realizaram-se na Guiné-Bissau as primeiras eleições
desde o golpe de Estado de 2012. O país encontra-se no bom caminho para o alcance
da paz e segurança?
Penso
que sim. Estas eleições na Guiné-Bissau foram consideradas democráticas pelos
observadores. Neste momento, existe condições para o caminho da normalização
democrática. Penso que o meu acro amigo, engº Domingos Simões Pereira (primeiro-ministro)
é a pessoa ideal para levar este caminho a bom porto. O que tem falhado na Guiné-Bissau
é a forma como se tem tratado com as chefias militares. Não se pode fazer
aquilo que a União Europeia quis fazer com a reforma do setor da segurança na
Guiné-Bissau: tomem lá umas verbas e vocês (militares) afastam-se. Não se pode
fazer uma reforma do setor da segurança da forma como estava a ser feita. Neste
momento, existem condições para criar esta estabilidade; primeiro internamente,
que é o que está a acontecer, e depois no âmbito dos apoios externos. A Guiné-Bissau
precisa de ajuda externa, de uma normalização democrática dos processos a nível
interno e de uma reforma do setor da segurança mais inclusiva. Mas isto levará
o seu tempo.
No
presente existe o risco de um novo golpe?
O risco existe sempre... As Forças Armadas estão em processo de reajustamento, a sociedade também, não só etnicamente como politicamente. A Guiné-Bissau é um país dividido étnica e politicamente. Mas quanto menos apoios tiverem reunido, quanto menos envolvimento da Comunidade Internacional, mais possibilidade de voltar ao passado recente…esperemos que não…
Fonte-Tchogue
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