A cidade histórica de Cacheu, que é considerada o berço do cristianismo no país, foi inundada no passado sábado por cerca de dez mil fiéis católicos provenientes das diferentes partes do país, para tomar parte na peregrinação anual ao Santuário Mariano “Nossa Senhora da Natividade”. A Comissão Organizadora que tinha previsto acolher três mil peregrinos, acabaram por marcar presença, na manhã de sábado, cerca de dez mil fiéis cristãos católicos que marcharam sete quilômetros ou seja, da aldeia de Capó para o centro da cidade de Cacheu.
A peregrinação ao Santuário Mariano deste ano foi realizada sob o lema “DJUNTU KU MARIA NO KONTEMPLA MISERIKORDIA DE DEUS – Juntos com a Maria Contemplemos a Misericórdia de Deus”.
Os habitantes da cidade tida como o berço do cristianismo do país viveram momentos de amizade e de fé durante os dias 3, 4 e 5 do mês em curso, devido a presença massiva de peregrinos que vieram das duas Dioceses em que se encontra dividido o país em termos religiosos católicos. As informações apontam para zero caso de incidentes, porém foram registados casos de dores de cabeça e da barriga, como também tonturas, avançou os activistas da Cruz Vermelha local.
A nossa reportagem constatou igualmente a presença de representantes da comunidade muçulmana, a convite da igreja católica, através do Imane da mesquita de Cacheu, assim como de alguns jovens que se deslocaram, em solidariedade com os irmãos cristãos da Guiné-Bissau.
LAMPRA CÁ CONSIDERA A PEREGRINAÇÃO DE CONVITE À PENITÊNCIA
O Bispo Auxiliar de Bissau, Dom José Lampra Cá, disse na sua declaração ao nosso jornal que qualquer tipo de peregrinação, à luz da religião, é sempre um convite à penitência ou a conversão.
“Significa nós, que somos religiosos, devemos e nem sempre temos a consciência clara de que comportamos como se deve, então, precisamos fazer este tipo de autoacusação, tentarmos ver o que não vai bem na nossa vida. E a luz dos mandamentos da lei de Deus, devemos ter a humildade de dizer que somos pecadores e então pedirmos perdão a Deus”, acrescenta.
Lampra Cá lembrou ainda que este ano foi dedicado à misericórdia, sublinhando que a divina misericórdia é a grande bondade de Deus de conceder perdão aos pecadores, mas com o pecador a arrepender-se.
“Tentamos desde ontem veicular esta exortação no sentido de que se quisermos beneficiar do perdão, da renovação interior ou espiritual, devemos abrir os nossos corações, reconhecendo que somos pecadores e com o propósito de emenda, dizer a Deus que reconhecemos a nossa condição pecadora e precisamos da sua misericórdia”, explicou.
Instado a pronunciar-se sobre o lema escolhido este ano para a peregrinação, José Lampra Cá reiterou que este ano foi decretado pelo Papa Francisco como Ano Jubilar da Misericórdia. No entender do Bispo Auxiliar de Bissau, o Papa Francisco quis convidar os crentes católicos para tomarem a consciência de que ser cristão não significa ser santo, mas sim estar em caminho da santidade, ou seja, em direcção à santidade.
“O Papa sabe que não é o pecado que nos impede de sermos santos, mas é a incapacidade de sabermos gerir os nossos pecados. Gerir os nossos pecados significa tomarmos a consciência de que erramos, pedirmos humildemente o perdão a Deus. Como a Maria na história da salvação foi um modelo, porque soube pôr em prática a palavra e a vontade de Deus, beneficiando de um grau mais alto da misericórdia e da bondade de Deus. Se imitarmos aqueles que imitam a Deus, estaremos em condições requeridas para podermos beneficiar da misericórdia de Deus”, notou.
Solicitado a pronunciar-se sobre o significado da cidade de Cacheu na religião católica guineense, Lampra espelhou que do ponto de vista histórico, indica que o primeiro lugar por onde os portugueses passaram foi Cacheu, ficando como um mito histórico do país. Afirmando que os lusitanos vieram na altura com alguns padres que tinham como missão a cura espiritual dos lusos que chegaram, na altura, a cidade mais antiga da Guiné-Bissau.
“Colocando o santuário nacional em Cacheu, queremos recordar que os primeiros missionários que nos trouxeram a palavra de Deus tocaram o solo da Guiné-Bissau a partir de Cacheu. Portanto, é uma espécie de fazer a memória histórica para dizer que se nós não revisitarmos o passado, corremos o risco de não termos a ideia clara sobre a nossa identidade e nosso perfil”, alertou auxiliar de Dom José Câmnate Na Bissign.
IMAME DE CACHEU REALÇA A SOLIDARIEDADE ISLÂMICA E CATÓLICA
Em representação do Conselho Nacional Islâmico (CNI), o Imame da mesquita de Cacheu, Aladje Mamadú Mané, presente na cerimónia, considerou que a presença muçulmana nas actividades de peregrinação católica à cidade de Cacheu não é de hoje, mas sim constitui uma longa tradição, justificando que os seus antepassados solidarizavam-se sempre com a comunidade católica, assim como a católica com a muçulmana.
“Quando a comunidade católica tem qualquer evento convida a comunidade islâmica, também, se a comunidade islâmica tem actividades convida sempre a comunidade cristã para tomar parte na cerimónia”, disse, enaltecendo o diálogo inter-religioso.
Mamadú Mané disse que o acto de peregrinação significa ainda um sinal de bênção e de unidade, afirmando que sempre os pedidos não fogem da paz e união entre os guineenses.
“Também pedimos pela nossa Guiné-Bissau, para que haja a paz, união e desenvolvimento em todos os aspectos, assim como rezamos para a união dos nossos governantes para que possam trabalhar para o bem-estar da pátria de Amílcar Lopes Cabral”, sublinhou o líder religioso.
ADMINISTRADORA DE CACHEU VÊ A PEREGRINAÇÃO COMO SINAL DE PAZ
A Administradora do Sector de Cacheu, Ana Paula Sanches, vê na realização da cerimónia religiosa de Peregrinação como uma oportunidade para criar um ambiente de paz e bem-estar para todos os filhos da Guiné-Bissau.
A administradora afiançou que a cerimónia poderá permitir que o país tenha paz e estabilidade para que possa avançar rumo ao desenvolvimento.
Sanches agradeceu ainda a Deus por tornar realidade a referida peregrinação, lembrando que no ano passado não se realizou devido a risco de doença de Ébola que propagava na vizinha Guiné-Conacri.
A Administradora de Cacheu confidenciou a “O Democrata” que pretende impulsionar o desenvolvimento urbano projectado pelo governo.
“Dentro de programa de governo foram eleitos três polos de desenvolvimento urbano, Bafatá, Cacheu e Bolama. Como forma de ajudar as cidades a crescerem.” Precisou a responsável, sublinhando de seguida que aquelas cidades modelos vão por sua vez impulsionar o desenvolvimento de outras cidades do país.
Ana Paula Sanches esclareceu que o desenvolvimento das cidades não se limita apenas à construção de estradas, casas e escolas, mas sim de uma forma geral, sobretudo em melhorar a condição social da população nomeadamente na luta contra fome e pobreza.
Porém, a governante prometeu que se tudo correr como previsto, dentro de pouco tempo a cidade Cacheu passará a ter outro rosto. Nesse particular, Ana Paula revelou a “O Democrata” que está prevista construção de uma escola de turismo em Cacheu como forma de potencializar e dinamizar o sector turístico.
Segundo a governante, a referida escola vai funcionar nas antigas instalações da FISCAP na região. As obras já estão em curso. Na sua visão, a escola vai permitir aos jovens permanecerem na região, evitando dessa forma o êxodo rural.
Em termos da segurança, Ana Paula Sanches afiançou que tudo está bem, adiantando que não há situações que possam ser consideradas de grave situação de insegurança. “Desde que vim para Cacheu como administradora não constatei nenhuma situação de insegurança. Cacheu praticamente é um sector calmo”.
MUSSA DJALÓ: ‘PEREGRINAÇÃO É MOMENTO IMPORTANTE PARA CATÓLICOS’
Para o jovem peregrino, Mussa Djaló, aquele sacrifício religioso é um momento importante na vida de qualquer cristão católico, porque rezam e contemplam a Deus, trazendo todas as preocupações junto da “nossa mãe” ‘Nossa Senhora da Natividade’. Djaló já contabiliza cerca de dez peregrinações ao santuário Mariano de Cacheu.
Contou que na peregrinação, os fiéis rezam em uma única voz pedindo a Deus e louvando a Maria por tudo aquilo que fez pela humanidade. Assegurou que é um momento de oração importante que junta os cristãos católicos vindos de diferentes regiões do país com um único objectivo de gabar `Nossa Senhora e pedi-lhe que derrame a sua graça sobre o povo da Guiné-Bissau.
Questionado a pronunciar-se sobre o lema, Djaló asseverou que Nossa Senhora é uma pessoa especial para os fiéis católicos, porque em primeiro lugar é mãe de Jesus Cristo, na qualidade de quem trouxe a salvação à humanidade.
“O lema escolhido – “DJUTU KU MARIA NO KONTEMPLA MISERIKORDIA DI DEUS”, significa que Maria é alguém que pode dar a sua força aos cristãos católicos para poderem beneficiar da misericórdia de Deus. E para ter esse perdão de Deus precisamos de Maria, da sua força e precisamos ainda que Ela interceda para nós junto de Deus, para que deus possa derramar a sua misericórdia sobre nós”, frisou Mussa Djaló que pertence à comunidade da Nossa Senhora de Fátima. Ele é Escuteiro de Agrupamento número 7.
Djaló apontou a ausência de qualquer incidente até a altura que falava aos microfones da reportagem de semanário “O Democrata”, como o sinal de que Maria, Jesus e a força do Espírito Santo está com a comunidade cristã e todos os presentes na peregrinação, afiançando que continuarão a proteger os fiéis católicos.
VILMA DIAS: PEREGRINA ESTREANTE REZA PELO BEM-ESTAR DO PAÍS
A adolescente e igualmente Escuteira da igreja Nossa Senhora D’Ajuda. Vilma Dias, estreante na peregrinação, mostrou-se entusiasmada por ter participado na sua primeira peregrinação a cidade de Cacheu, não obstante ter lamentado a distância donde os peregrinos começam a marcha para o santuário, revelando que não conseguiu chegar ao local e foi ajuda por uma viatura que a levou até ao local de culto.
Para a pequena Vilma Dias, a peregrinação é um lugar onde cada um participa para meditar, pedindo bênção de Deus sobre os seus desejos. Revelou que fez orações para o bem-estar da Guiné-Bissau e para o sucesso dos seus irmãos.
A jovem enalteceu o acolhimento dos citadinos de Cacheu que lhes proporcionaram um bom ambiente, apontando a disponibilização dos locais de acampamento para os peregrinos. Garantiu que estará na próxima peregrinação de 2016 à cidade berço do cristianismo na Guiné-Bissau.
CRUZ VERMELHA DE CACHEU FEZ BALANÇO POSITIVO DA PEREGRINAÇÃO
O presidente de voluntários da Cruz Vermelha do Sector de Cacheu, Roni Ro Gomes considerou de positivos os trabalhos realizados pela sua organização, revelando que apenas depararam com casos ligeiros.
“Assistimos somente casos ligeiros entre dores de cabeça, da barriga, também tonturas”, contou o responsável. Sublinhou que não contaram com apoios dos serviços de Bombeiros, nem do hospital local, que chegou a última da hora. Acrescentou que a Cruz Vermelha fez aquilo que pode.
Ro Gomes avançou que registaram-se no total setenta casos e realçou o papel importante dos três (3) elementos da Cruz Vermelha de Canchungo que reforçaram os 23 voluntários de Cacheu, elevando o número para vinte e seis (26) activistas que cobriram os dias do evento religioso, no que tange as emergências.
A missa foi celebrada pelo Bispo de Bissau, Dom José Câmnate Na Bissign na presença de outros dois bispos, o da Diocese de Bafatá, Dom Pedro Carlos Zilli e o auxiliar da Diocese de Bissau, Dom José Lampra Cá e perante milhares de fiéis católicos do país e da sub-região.
O governo regional participou ao mais alto nível, na qualidade do governador, Rui Gonçalves Cardoso, assim como da administradora local Ana Paula Sanches.
CIDADE DE CACHEU – BERÇO DO CRISTIANISMO NA GUINÉ-BISSAU
A cidade de Cacheu, berço de cristianismo no país, foi fundada em 1588, sendo a primeira povoação portuguesa na Guiné-Bissau e dependia administrativamente de Cabo Verde.
Dois anos depois da chegada dos portugueses a cidade de Cacheu, foi construída a igreja católica no ano 1590. Ainda de acordo com as informações, é a mais antiga igreja na costa ocidental da África. A primeira peregrinação feita pelos fiéis católicos naquela cidade nortenha do país foi no ano de 1984.
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