GUINÉ-BISSAU: A LEPROSARIA DE CUMURA, UMA ALDEIA (QUASE) ONÍRICA



A cerca de 12 km de Bissau, capital da Guiné-Bissau, visitámos o Hospital de Cumura, uma das unidades hospitalares mais conhecidas do país, na vanguarda da luta contra a lepra (doença de Hansen). Criado pela Ordem Franciscana em 1955, a maioria da assistência social é garantida por missionários católicos, que asseguram a recuperação e reintegração dos doentes. Lá, fomos guiados até à aldeia dos leprosos por Ricardo Pereira, administrador do hospital.

Há já 60 anos que esta estrutura hospitalar acolhe doentes com lepra de todas as partes da Guiné-Bissau e além-fronteiras. Mas a sua acção é mais ampla; tem assistência pediátrica e à maternidade, pré-natal e pós-parto. E de 2000 para cá tornou-se num centro de referência para doentes com HIV/Sida e tuberculose. Mais recentemente, para responder à elevada procura, foi criada uma unidade de clínica geral, que se apresenta logo à entrada do hospital. Mais ao fundo, ladeado por árvores frondosas, há duas estruturas sanitárias, e, a alguns metros, uma aldeia de leprosos.

«Os missionários chegaram a Cumura em 1955 enviados pelo Papa Pio XII para tomarem conta dos leprosos que viviam isolados, abandonados a si mesmos», contextualizou Ricardo Pereira.

Após a chegada dos missionários, foi se iniciando, aos poucos, uma cobertura à grande escala ao serviço da lepra, «que mais tarde se viria a alargar às famílias dos doentes». Já curados, «e uma vez que há muita discriminação no que concerne a este patologia, foi construída uma aldeia de acolhimento, onde cada um recebe uma parcela de terra para cultivar alimentos de subsistência», acrescentou.

Naquela aldeia tudo depende da missão que está à frente da instituição; o apoio social, a alimentação e o tratamento. Há um enfermeiro que deixa regularmente as instalações centrais e se desloca à aldeia de acolhimento para acompanhar os que lá residem. Entretanto, a aldeia foi crescendo – actualmente é habitada por 24 leprosos e cerca de 40 crianças -, constituíram-se famílias e agora quem a visita irá encontrar ex-pacientes com as suas mulheres e filhos. Vivem em regime aberto: recebem visitas e podem sair sempre que desejam.

Parece onírico. Fecha-se os olhos e ouvem-se pássaros, o suave restolhar das árvores embaladas por uma delicada brisa, gargalhadas ao fundo de grupos de amigos reunidos para jogos de tabuleiro. 

O Hospital de Cumura, além dos casos de lepra, começou entretanto a dedicar-se à assistência ao parto, pós-parto e pré-natal, e organizou-se para apoiar os doentes com HIV/Sida e tuberculose. Hoje em dia, a unidade é a que alberga o maior de doentes com sida no país. Ali dão também entrada as gestantes diagnosticadas como seropositivas que são colocadas num programa de defesa da criança, uma intervenção que vai desde os quatro meses de gestação até a 18 meses após o parto, para prevenir que as crianças sejam contaminadas pela síndrome da imunodeficiência adquirida.

O hospital integra uma direcção clínica, um serviço de enfermagem e um serviço de apoio e diagnóstico, com um laboratório de análises clínicas, serviços de radiografia e ecografias. Além disso, há ainda os serviços de apoio, como o refeitório, a lavandaria, a limpeza e jardinagem.

Trabalham nesta unidade cerca de 150 pessoas, na sua maioria voluntários, padres e irmãs. O maior fornecedor de medicamentos a este hospital é a IDA Fundation da Holanda.

Face aos escassos recursos financeiros, de materiais e, sobretudo, de sangue, uma vez que a instituição não conta com a ajuda de entidades privadas, durante a nossa estada o hospital recebeu pela primeira vez a visita de um presidente da república, coincidindo com a presença de uma missão humanitária de médicos portugueses.

O actual chefe de Estado, José Mário Vaz, na sua deslocação, assegurou o financiamento para a alimentação dos doentes, transferindo mensalmente para os cofres da unidade um milhão e meio de francos CFA (cerca de 2.300 euros) até ao fim do seu mandato. Prometeu ainda ajuda para o tratamento dos pacientes.

O Diário Digital continuará a publicar ao longo dos dias várias reportagens sobre a realidade deste país.


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