VACINAS DIMINUÍRAM MORTALIDADE INFANTIL DE 50 PARA 7% NA GUINÉ-BISSAU - ANTROPÓLOGO






A introdução de um programa de vacinação das crianças é a principal razão para a descida da taxa de mortalidade infantil na Guiné-Bissau, que passou de 45% em 1980 para cerca de 7% atualmente.

De acordo com o antropólogo que há quase 40 anos está no país africano a estudar estes temas, "a principal razão para a queda da taxa de mortalidade infantil foi a introdução de um programa de vacinação contra o sarampo, e não a má nutrição, como se pensava".

Em entrevista à Lusa em Lisboa, Peter Aaby contou que logo nos primeiros anos de introdução do programa, em 1978, a taxa de crianças que morriam antes dos 5 anos passou de 45% para 20%, o que é "uma enorme descida", mas que não respondia à principal questão, que era saber de que morriam estas crianças, uma vez que só o sarampo não contabilizava todas estas mortes.

"Quando começou o programa, toda a gente achava que a razão de as crianças morrerem mais nos países mais pobres tinha a ver com a má nutrição, mas nós analisámos 12 mil crianças e concluímos que só duas estavam mal nutridas, e estavam porque as mães tinham morrido, por isso não tinham sido amamentadas", disse o especialista, que foi ficando no país "para perceber, então, de que morriam as crianças".

A pesquisa levada a cabo desde então mostrou que "não há diferença entre os que, tendo morrido na epidemia de sarampo que aconteceu nos anos 80, estavam mal nutridos ou bem nutrido".

"Se não era a má nutrição, então o que era? Foi para perceber isso que fiquei no país, e o que descobrimos é que tinha a ver com a sobrelotação das casas, ou seja, tinha a ver com o facto de a maioria das casas no país albergar várias famílias e muitas crianças", disse.

A investigação do dinamarquês Peter Aaby permitiu concluir que "quem morria não era sempre a criança infetada que ia para casa, mas sim os que viviam à volta dela, muitas vezes no mesmo quarto e partilhando a mesma casa - esses é que eram as vítimas, porque eram intensamente infetados, a dose de infeção era muito maior".

Até então ninguém tinha pensado nisto, lamentou o investigador, notando que outra das conclusões é que a vacina contra o sarampo mostrou-se eficaz noutras áreas, o que é bastante discutível dado que a orientação da Organização Mundial de Saúde aponta para que cada vacina seja eficaz apenas no tratamento de determinada doença ou infeção.

"A vacina contra o sarampo tem um 'efeito secundário', que é um estímulo no sistema imunitário, como se o ensinasse a combater outras infeções, mas isto é problemático, porque o programa de vacinação global [da OMS] parte do princípio de que cada vacina protege contra uma determinada doença, e não se leva em conta os efeitos não especificados dessa vacina", argumentou o investigador que está em Lisboa para receber hoje um doutoramento 'honoris causa' da Universidade Nova de Lisboa.

As conclusões obtidas através da investigação nas crianças da Guiné-Bissau aplicam-se também às da Europa, argumentou o professor, deixando o aviso: "O meu medo é que a taxa de infeções de doenças vá subir porque nalguns países se pararam as vacinas contra o sarampo, mas que combatiam também outras doenças, ao aumentar a força do sistema imunitário".

Os efeitos da vacinação em criança são duradouros, concluiu o professor, apresentando um gráfico que mostra o declínio da mortalidade infantil na Guiné-Bissau e garantindo que neste país "quem foi vacinado contra o sarampo (visível pela cicatriz circular que deixa no braço) tem uma taxa de mortalidade inferior, mesmo 30 anos depois, e isto é verdade também na Dinamarca".

MBA // VM

Lusa/Fim


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